"Permitir-me ser louca,porque todo mundo é, e piores são aqueles que não sabem que são, porque ficam repetindo apenas que os outros mandam."
(Paulo Coelho; "Veronika Decide Morrer")
Ele gritava e sua voz rouca ecoava na alma dos passantes daquela estação. Sua voz grave cortava o silencioso burburinho dos transeuntes que apressadamente seguiam a direção do próximo metrô. Eu ouvia. Ele era um homem e gritava. Ele era um grito e existia. Suas palavras desconexas seguiam sem direção penetrando nos ouvidos dos passantes incomodados com o "senhor dos gritos". As mulheres corriam com seus saltos altos coloridos e casacos de pluma. Os homens riam. Ele é um louco!, diziam. Um velho louco! Internem este homem! E ele,continuava a berrar aos quatro ventos, palavras desconhecidas, urros, lamentações sem sentido, gemidos amargurados. O mundo parou para ver o homem gritar. O mundo. Quê mundo? Aquele mundo, das mulheres de saltos altos, dos homens de ternos e cabelos penteados. Aquelas pessoas que andavam e que iam para o trabalho, que ganhavam e compravam uma nova tv, que ganhavam e compravam um carro do ano, um casaco de pele de uma chinchila ou de um guaxinim talvez. Eram aquelas pessoas que riam do infeliz homem sentado em meio a tanta gente normal. Aquele louco dos cabelos cinzas e olhos rasos que ouvia os passos batendo no chão. Parece um bicho!, surrussou uma senhora. E ele continuava a berrar, enquanto o mundo girava, enquanto as pessoas normais continuavam a matar chinchilas e outros animais, a trabalharem para comprar, a usar a miraculosa razão e inteligência para levar o progesso para a sociedade juntamente com a ordem é claro; destruindo tudo o que for um impecilho para a maravilhosa evolução do mundo. Afinal, é preciso, não é? É preciso destruir e é preciso rir dos loucos que gritam. E enquanto o mundo parara para ouvir seus gritos, o velho parara para ver a destruição do mundo. Seus lamentos eram por aquela gente que cortava a estação. Quem era louco, a sociedade da evolução ou o velho grisalho? As pessoas não sabiam e jamais poderiam desconfiar, mas o velho se sentara para ver a loucura do mundo, a insanidade da sociedade, e o mundo gritava estampando o rosto das pessoas. Fui para casa naquele dia, com a voz do homem latejando em minha mente. Coloquei para tocar uma música do Nirvana, e enquanto ouvia, me senti como aquele velho, incurralada pela falsa normalidade dos outros, e então, gritei.
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