Gosto do gosto que tu tens, e do enrosco que de ti provém. Gosto de tua face irresoluta, e dos olhos rútilos que a compõe, tão vivos, tão expressivos. Sugo-te em plena essência, vivo de tua eloqüência, choro e me derramo, em leitoso pranto, que escorre no canto de tua ausência. Descasco meus dissabores, sou tua, vaga e vã, seguindo nossos ardores. Digo sem dizer-te, ouvindo tuas sílabas advindas, que roçam ao pé dos meus ouvidos, que encostam teus nós em meus sentidos, que gritam, fluem, pungentes em meu ser. Comprimo e transbordo-te, aos poucos, sugando-te sem receios, extraindo, indo e vindo, aspirando e resvalando em tua pele morna, sem rodeios. Eriço-me sem pudores, sou tua em nossos fulgores, compartilhando os vícios teus, enquanto corres teus dedos pelos meus. Crua, sem querer nem ter meios de ir. Nua, inalando e embriagando sem temores, os pedaços de ti.
Teu Silêncio
Ouço-te. Sinto tua voz em mim, fragmentada, em movimentos difusos e imperceptíveis. Te escuto entre partículas de silêncio, soando tão universal e intimista e oblíquo. Fecho minhas pálpebras calmamente, e sinto-me completa em teu timbre. Grito calada. Pareço estar presa, arranhada, em carne viva pulsante. Tento escapar, fugir, me refugiar em outro lugar, mas logo vem a paradoxal sensação de contentamento, e passo a gostar das grades que me prendem. Começo a alimentar-me delas, e desta estranha sensação tão ínfima, que me sacia e me esvazia. Transformo-me em nó aturdido, sangrento, vezes caído, vezes fluindo contentamento, ao respirar seus poros que me dopam docemente em eloqüência sacrílega. Embebedo-me em silêncio. Sua ordem fazendo minha desordem. Teus olhos reluzindo, indo e vindo, enquanto te espero, procuro e desejo em insanidade. Não anseio minha libertação, sinto-me completa em ti, em nossos instantes roubados. Completa. Nesta eterna sensação paradoxal, tenra e tão irreal.
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