Sem Cortinas ou Guarda-Chuvas


Pessoas precavidas não me atraem. Jorro isso aqui, sem o menor pudor, porque minha mente está embaralhada, estou suando devido ao calor, e tenho uma caneca de leite ao lado, com achocolatado e muito açúcar, claro. Me refiro a elas (às pessoas precavidas) porque é fácil se deparar com elas. É preciso cuidado para não se tornar uma delas.

As pessoas precavidas, costumam puxar as cortinas para tapar o sol, comprar guarda-chuvas quando começa a respingar. Costumam conter o choro quando precisam chorar, e segurar o riso quando é necessário sorrir. Pessoas precavidas tendem a tomar precauções para com a vida, porém estão enganadas. Não há precauções para se tomar com a vida. A vida não pode ser tapada com cortinas, nem avisa quando vai respingar para que se possa comprar um guarda-chuva novo. Muito menos, manda previsões de choro ou riso. A vida é pura. Não dá pra ser cuidadoso com ela. Não há tempo para se tomar precauções. Ou se vive, ou não se vive. Ou se mergulha, enfrentando adversidades e alegrias, ou se bóia, no meio termo, meio-vivo.

Já dizia Charles Chaplin que assim como a morte, a vida é inevitável. Gosto de sentir esse cheiro de roda viva que é a vida. Gosto do gosto de chuva, de me molhar, do sol queimando minha pele e fazendo arder meus olhos. Gosto do gosto que a vida tem.

Também gosto das pessoas eloquentes, que gritam, que são rejeitadas pelas pessoas antiquadas (e precavidas), que não tem medo da vida. Estas são as mais confiáveis. Porque elas tem medo, mas além do medo, elas possuem o medo de sentirem medo, e assumem, e isto é o mais fascinante. São inusitadas, e surpreendentes. Choram quando menos se espera, assumem seus sentimentos sem nenhuma restrição, sem precisar ler manuais ou livros de auto-ajuda (com exceção de alguns, lógico), e principalmente, rejeitam qualquer tipo de julgamento.

A vida foi dada a cada um, não para que a guardemos num frasco de vidro para vivê-la amanhã. É impossível preservá-la de modo que possa ser vivida mais tarde. Ela é este segundo, é este já, é o momento que já passou, e o que está passando.

Portanto, não feche as cortinas para ela. Vamos abri-las e encarar todas suas intempéries e emoções, vamos chorar e rir, unicamente, puramente, sem restrições, pois só assim estaremos saboreando-a, sugando-a, mordendo-a apetitosamente, de modo que ao chegarmos em seu fim, olharemos para traz e nos sentiremos saciados e orgulhosos da intensidade que se vive a vida, quando se deixa de lado os guarda-chuvas e cortinas.

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